Vingança Comprada


Cidades suburbanas podem ser ótimas. Nem sempre são cidades longe dos grandes centros. Algumas foram planejadas justamente para ficar ao lado da badalação da cidade. Também pode-se dizer que é um cantinho calmo ao lado da selva de pedra. Geralmente, nesses lugares, as pessoas também trabalham em grandes centros, aliás, a motivação de morar nesses bairros é a de morar perto do trabalho, mas sem querer está dentro do olho do furacão. Não importa se leva 10 ou 20 minutos a mais para se chegar ao trabalho, ainda sim, o sossego vale a pena.
Esse nicho abriga famílias de todos os tipos, mas tem um fator bem interessante: os vizinhos se conhecem. A convivência geralmente é pacífica, como se buscasse ter o mesmo clima de cidades do interior, o que até poderia acontecer. Geralmente, as casas nesses lugares não são baratas, então, quando se adquire uma, é para a vida inteira. Por isso, é possível acompanhar história de famílias ao longo da história da cidade.
As ruas vazias durante o dia possibilitam que as crianças brinquem ao chegarem da escola. Falando das crianças, são sempre referenciadas pelos pais: filho de Fulano, filha de Beltrano. Alguns são conhecidos por serem bem educados, outros, nem tanto. No caso destes, os pais são imediatamente avisados e os pequenos diabos são levados ao castigo da falta de sobremesa ou ficar alguns dias sem brincar com os amiguinhos.
Em uma dessas cidades, havia uma dessas crianças bem educadas, uma menina. Seus pais eram personagens de propaganda de margarina. Ambos trabalhavam e ela ficava com um casal de meia idade, que trabalhavam apenas meio período, ela era tratada como se fosse uma filha caçula ou até mesmo uma neta. A menina tinha uma educação compartilhada, durante a tarde, ao chegar da escola, ficava com o casal. Almoçava com eles e fazia as tarefas escolares.      À noite, os pais chegavam e estavam os três a espera na varanda. Geralmente os homens trocavam apenas cumprimentos enquanto as mulheres discutiam sobre algumas peculiaridades femininas. Às sextas era um dia de cerveja e jantar. As famílias revezam em qual casa se reuniam para jantar. Eram tão próximos que muitos achavam que eram da mesma família, até eles mesmos.
O tempo passou, a menina cresceu, teve seu primeiro amor, sua primeira decepção. Sua primeira vez foi marcada por uma decepção materna ao mesmo tempo por um abraço materno. Sua segunda mãe, a vizinha, aproveitou e deu conselhos sobre garotos e prazer e o segundo pai apenas ficou chateado. No jantar em seguida o clima ficou estranho porque todos queriam comentar o assunto, mas evitavam. Ainda sobre as nuances do tempo, a segunda mãe ficara doente e aposentou-se cedo e a menina, já mulher, ajudava a cuidar da vizinha enferma.
Um dia a rotina foi quebrada. A segunda mãe contava com a presença da garota porque o marido chegaria mais tarde do trabalho e ela precisava de ajuda e a menina não veio. As horas passaram e nada. Ligações foram feitas para cada um e nenhum sabia responder. O pai da menina saiu mais cedo trabalho e infelizmente foi o primeiro a descobrir a tragédia. Sua princesinha fora estuprada, em casa, pelo ex-namorado que não aceitou a separação.
Nesse interim, a vizinha havia caído, de tanto andar de um lado ao outro da casa de preocupação, e bateu a cabeça na mesa. Enquanto uma família ia para a delegacia, outra ia para o hospital. A mulher não resistiu e morreu. O caso de polícia foi mais longo. Após semanas de espera, recursos, atrasos de justiça, um bom advogado que o dinheiro conseguia pagar, o rapaz conseguiu escapar da prisão. Foi um choque para os pais que gostariam de justiça, ao menos para amenizar a dor.
Em uma das noites de sexta, após o julgamento, com uma das famílias incompleta e outra abalada o pai disse ao vizinho:
- Sabe, criei, eduquei, tratei com carinho para um desgraçado, filho da puta fazer isso e ainda conseguir escapar. Só porque o pai é rico. Não existe justiça nesse mundo? É uma dor muito forte, sabe? – pai começa a chorar –
Não sei o que fazer, não sei mesmo. Gostaria de fazer algo. É uma sensação ruim, de impotência. Desculpe esse bode velho estragar sua cerveja. Era para ser uma noite agradável, mas não tem como, nem hoje e não sei até quando.
            O vizinho ouviu como se fosse ele mesmo dizendo. Afinal, a menina era uma filha para ele. Ainda mais, perdeu a esposa no processo e o delinquente estava solto. A sensação de invalidez batia forte. Pensava em como poderia ter evitado aquilo se não aceitasse tomar uma cerveja com os colegas e voltasse para cuidar da esposa. Um misto de ódio e culpa fervilhava em sua cabeça.
            Os dias passaram-se e quando a ferida ia cicatrizando, o rapaz surgiu, como uma criatura do inferno com seu carro rebaixado e som alto perturbando a vizinhança. O pai chamou a polícia e resultado foi um processo em suas costas por estar “perseguindo” alguém por uma cisma pessoal. Os dias alegres foram embora. O vizinho assistia a isso e lembrava do porquê sua cama parecia maior, sua vida não havia mais sentido.
            O ex-namorado insistia em passar em frente a casa da moça e fazer suas provocações rotineiras. Era tarde da noite e o pai da menina saiu para fazer uma besteira. A mulher ligou para o vizinho para impedi-lo e a rua toda assistiu o sofrimento de um pai. Segurado pela mulher e pelo amigo, ele berrava que não podia aceitar aquilo. Ainda bravo, falou coisas que não deveriam nunca ser ditas:
- Você nunca teve uma filha para entender o que aconteceu. Seu mundinho era só você e sua mulher. Agora, me largue!
            Era verdade que o mundo daquele homem era sua mulher, mas isso porque não teve a oportunidade de ter um filho. As palavras do amigo, vizinho, doeram. Apesar de entender todo o estresse com o qual o vizinho estava passando, ainda doía ouvir.
            As semanas seguintes foram marcados pelo silêncio entre as casas com interrupções do rapaz e seu carro barulhento. O vizinho não conseguia mais suportar aquilo e tudo que escutara ainda o martirizava. Como sabia da rotina do infeliz, armou um plano para acabar com aquilo. Em uma noite, esperou o jovem aparecer e saiu correndo de sua casa para pedir carona (uma vez que ele sempre reduzia a velocidade para passar em frente da casa). O jovem reconheceu o senhor e achou estranho aquela situação e ainda sim resolveu dar a carona.
            Indicou as direções até que pararam em um sinal que foram abordados por dois criminosos encapuzados. Foram rendidos e vendados e levados a um lugar desconhecido. O jovem começou a falar que o pai dele poderia pagar resgate e que seria um bom negócio devolverem. Quando se deu conta de que não fora sequestrado sozinho, perguntou sobre o velho que estava com ele até que uma voz familiar apareceu e disse:
- Agora podem deixar comigo.
            O rapaz calou-se por um instante e chamou pelo vizinho. A venda foi tirada e o ex-namorado arregalou os olhos de surpresa ao ver o conhecido solto e tranquilo. Ao perceber a situação, começou a esbravejar até levar um soco. Antes que pudesse falar mais, lhe foi colocado uma mordaça. Seu pavor aumentou ao ouvir as seguintes palavras:
- Você acha que só porque tem um pai rico pode fazer o que quiser. Bem, vou dizer o que você fez: tirou minha humanidade. Violentou uma garota linda, acabou com sua vida e de sua família. Acabou com minha família. Minha esposa, minha razão de viver morreu por causa do que você fez.
O garoto tentou resmunga mas foi interrompido por um soco.
- Não lhe permitir falar. – O segundo pai dá um suspiro – Melhor eu fazer o que resolvi fazer. Um, Dois, venham aqui. – Um e Dois eram homens robustos com certos traços femininos. Aparentemente eram travestis e tinham esses nomes para não correrem o risco de serem identificados e enquanto eram apresentados, o temor do rapaz aumentou até que entrou em desespero ao ouvir:
- Usem-no crianças. Façam com que ele lhes de prazer, mesmo que ele não queira.
            Mesmo se debatendo, a força dos dois era superior. Um deles seria suficiente para subjugá-lo. Dois começou. Foi delicado o chupando e logo em seguida, com seu membro grande o penetrou. Não era possível ouvir seus gritos devido à mordaça, mas via-se a expressão de sofrimento no rosto do rapaz. E tudo se repetira com o Um. Enquanto Dois descansava, Um se mostrava mais bruto, chegando a dar tapas e socos. E depois de ser usado, foi largado ao chão como uma carne podre e chorosa.
            O vizinho voltou e trouxe uma bolsa. Retirou duas facas e avisou ao seu convidado que não seria para lhe castrar. Afinal, isso seria muito rápido e eles ainda teriam muito tempo até alguém sentir a falta do rapaz “pegador”. Aproveitou a posição frágil e enfiou as duas facas em suas nádegas. Após isso, com o rapaz de bruços e amarrado, valendo-se de um ferro quente, passou no pênis da vítima que estava tão bem amarrado que não conseguia resistir.
            Depois das torturas sexuais, prosseguiu com outras formas de molestas. Furou os pés, quebrou os joelhos com pancadas e por fim arrancou um dos olhos. Levou o que sobrara para a delegacia e ali entregou-se para a justiça. É evidente que a mídia se deliciou com a notícia chocante e enquanto o pai do ex-namorado disse que não descansaria até que justiça fosse feita. Mas para alguns ali, justiça tinha sido feita. O vizinho não pudera ser pai, mas tinha sentimentos de um e comprara para si o rancor, a sede de justiça que qualquer pai teria quando sua filha fosse violada. Vingara a filha que não fosse sua, uma vez que sua vida já estava vazia.

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