Ele assistia

Ele assistia sentado em banco da praça da igreja da cidade. Sim, ele observava as pessoas que outrora o conheciam. Enquanto fingia ler um livro qualquer, daquele ponto via como todos estavam agora e como o tempo seguira adiante. Viu aqueles pivetes catarrentos se tornarem homens e mulheres. Alguns deveriam não ter crescido. Viu aquela menina linda da escola, a qual nunca lhe dava atenção e mesmo assim nutria certos sonhos com ela, com um filho braço, outra menininha puxando pelo braço e com uma criança ainda por vir na barriga.
Ele se admirou ao perceber que o tempo fora generoso com certas pessoas. As aparências pouco mudaram. Em alguns casos, apenas uns fios de cabelo caíram e naqueles em que os fios permanecera, apenas mudaram de cor. Apesar de as aparências mudarem, parece que o papel social continuava o mesmo. As mesmas senhoras fofoqueiras (talvez querendo recrutar alguma não mais jovem senhora), o mesmo dono do bar, a mesma dona de padaria e o mesmos mendigos bêbados com mais colegas.
Ele se sentiu nostálgico, mas não sentiria falta dali. Voltou diferente de como saiu: cabelo, postura, roupa e óculos (não usava antes) e ficou invisível aos transeuntes (apenas mais algum parente de alguém). Reconheceu a muitos, alguns com certa dificuldade até que agissem conforme sempre agiram, outros, talvez passassem despercebidos ou não estivessem mais ali. Mas ninguém o reconheceu. Não achou que isso fosse ruim, mas no fundo sentiu uma tristeza por ter sido esquecido (mesmo sendo este o desejo de quando saiu).
Ele nem mais fingia ler o livro, apenas curtia a tarde de sábado que parecia ser igual desde os tempos de antigamente. Viu o marido (ou o homem da vez, não sabia) da antiga-garota-bonita-da-escola a tratar de forma bem ríspida. Porém, antes que aparecesse a surpresa, reconheceu-o dos tempos em que apanhava daquele homem nos intervalos entre aulas. Agora, era a vez dela, para o resto da vida.
Ele já estava cansando de ficar ali parado, era hora de seguir adiante. Ir ao bar talvez, ou tentar visitar alguém de quem não guardasse rancor, mas parece que não existia alguém assim. Aquele cidade o fizera mal, era difícil esquecer. Mas se sentiu grato ao ser expulso de lá, só assim deixaria de pensar do tamanho daquela cidade, pequeno.

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